As novas tarifas que os Estados Unidos pretendem impor ao vinho europeu podem chegar a impressionantes 200%, com impactos diretos nas exportações da França, da Itália e de outros países da União Europeia. O anúncio oficial aconteceu na quarta-feira, 03 de abril, pelo presidente Donald Trump, durante o chamado “Dia da Libertação” (Liberation Day), ocasião que promete reconfigurar diversos setores da economia internacional.
Atualmente, a tarifa americana sobre o vinho europeu gira em torno de 10 centavos de euro por litro. Com o possível aumento, analistas internacionais preveem uma elevação linear entre 10% e 25%, sendo a média de 20% a mais provável — ainda que distante dos 200% citados por Trump. Apesar disso, os impactos já são considerados expressivos o suficiente para gerar ampla preocupação na União Europeia.

Em 2023, o comércio entre Europa e Estados Unidos movimentou mais de US$ 1,74 trilhão, o que representa cerca de 30% do comércio mundial. No centro dessa relação está o setor agroalimentar, considerado vital para a economia europeia. A indústria de vinhos, especialmente, vê nas tarifas uma ameaça direta ao seu futuro nas prateleiras norte-americanas.
União Europeia cogita retaliação
A resposta da União Europeia às medidas americanas já está em debate. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou que o bloco está pronto para reagir com firmeza. “A Europa não começou esse conflito, mas está pronta para responder com força. Estamos entrando nas negociações com uma posição de força; a Europa tem muitas cartas na mão”, declarou.
Entre as possíveis medidas retaliatórias está a taxação de setores estratégicos dos EUA, como o de alta tecnologia. Também se cogita a aplicação da Lei do Mercado Digital, o que atingiria diretamente as Big Techs, além de sobretaxas ao bourbon americano. No entanto, parte do Parlamento Europeu demonstra cautela quanto a esse caminho, avaliando se retaliações desse tipo seriam, de fato, as mais estratégicas.
Preocupações da Itália e França
A Itália, maior exportadora europeia de vinhos para os Estados Unidos, teme fortemente os impactos das novas tarifas. O ministro das Relações Exteriores, Antonio Tajani, defende equilíbrio: “Não devemos abaixar a cabeça, mas também não devemos ser antiamericanos”, afirmou. Os EUA são o principal mercado para os vinhos italianos, somando 1,9 bilhão de euros em vendas, de um total de 8 bilhões em exportações.
Na França, o cenário é semelhante. Autoridades francesas questionam se retaliar com a taxação de bebidas alcoólicas americanas foi um erro. O primeiro-ministro François Bayrou criticou a inclusão do bourbon do Kentucky em uma lista de sobretaxas baseada em documentos antigos, o que pode ter intensificado as tensões com Washington.

Gabriel Picard, presidente da Federação Francesa de Exportadores de Vinhos e Bebidas Alcoólicas, também alertou para os riscos de uma retaliação mal calculada. Ele lembrou que muitos produtores de vinho nos EUA estão em estados tradicionalmente democratas, como a Califórnia, enquanto Kentucky, produtor de bourbon, é reduto do senador republicano Mitch McConnell, adversário de Trump. “Atacar o whisky ou os vinhos norte-americanos hoje é um grande erro tático”, disse Picard.
Indústria do vinho em alerta
Apesar das divergências quanto à melhor resposta, há consenso entre os produtores europeus sobre o risco das tarifas. A imposição de 200% em tarifas alfandegárias, por exemplo, poderia simplesmente inviabilizar os negócios.
“Com 200% de tarifas alfandegárias, os negócios param”, alertou Nicolas Ozanam, diretor da Federação Francesa de Exportadores de Vinhos e Bebidas Alcoólicas. A França, segundo maior exportador de vinhos para os EUA, registrou 3,9 bilhões de euros em vendas no último ano, o equivalente a um quarto de suas exportações no setor. Além disso, o setor é responsável por aproximadamente 600 mil empregos diretos e indiretos na economia francesa.
O governo francês já sinalizou disposição para o enfrentamento. “Não podemos nos deixar vencer por ameaças desse tipo”, afirmou Bayrou. Vale lembrar que a indústria de bebidas alcoólicas europeia já enfrenta desafios em outros mercados. A China, por exemplo, impôs recentemente uma sobretaxa que reduziu em cerca de 25% as vendas de conhaque e armagnac no país asiático.
Fonte: Revista Adega, adaptado pela Equipe Garrafa do Dia.